Farmacêuticas mudam seu modelo

 VALOR ECONÔMICO

Há quatro anos, a Pfizer Inc. estava prestes a abandonar um tratamento de combate ao câncer que mostrava poucas chances de resultados. Depois cientistas descobriram que a terapia funcionava, mas apenas em pessoas com uma anomalia genética específica - cerca de 6.000 pacientes por ano nos Estados Unidos.

Há alguns anos, a Pfizer provavelmente não faria mais investimentos em um mercado tão pequeno, dizem empregados da empresa. Mas aquela terapia experimental deu origem ao medicamento Xalkori, recentemente aprovado para um tipo raro de câncer de pulmão, pelo qual a Pfizer planeja cobrar US$ 115.200 por ano, por paciente.

É o novo modelo do setor: medicamentos como o Xalkori, que tratam doenças complicadas que atingem um pequeno número de pacientes os quais, depois de passarem por testes, mostram uma maior probabilidade de se beneficiar com o remédio. Essas terapias específicas podem ser lançadas no mercado mais rapidamente e a um custo menor.

Os resultados podem não atingir vendas de bilhões de dólares. Mas se isso resulta num produto que funciona para milhares de pacientes ou 10.000 pacientes, estamos interessados, disse Geno Germano, que comanda a divisão de câncer e tratamentos especiais da Pfizer.

Essa é uma grande mudança para uma companhia que até recentemente se focava em medicamentos como o Lípitor, pílulas com vendas de vários bilhões de dólares para tratar problemas comuns como o colesterol alto. O Lípitor ajudou a Pfizer a se tornar a maior farmacêutica do mundo em vendas; no seu pico, o remédio gerou mais de US$ 12 bilhões em receitas anuais no mundo todo e, de acordo com a Kluwer Pharma Solutions, a empresa tinha 11,7 milhões de pacientes só nos EUA.

O Xalkori surgiu como um projeto típico da Pfizer, com o objetivo de tratar o que se pensava ser um tipo relativamente generalizado de câncer de estômago. Mas em testes clínicos iniciais, o composto, genericamente conhecido como crizotinib, não funcionou para a maioria dos pacientes.

Então, em 2007, cientistas da Pfizer como James Christensen leram na revista científica Nature sobre a descoberta de uma deficiência genética que causava certo tipo de câncer. Christensen sabia que o crizotinib tinha dado resultados em testes cujo alvo eram as alterações moleculares que causavam essa falha genética, conhecida como gene ALK.

Christensen e outros pesquisadores do crizotinib decidiram ver se o composto funcionaria nos pacientes com câncer de pulmão. Eles pesquisaram muito, até mesmo recrutando um homem que estava comentando seu câncer de pulmão numa igreja também frequentada por um cientista da Pfizer.

A intuição dos pesquisadores estava correta. Normalmente, apenas 10% dos pacientes com câncer de pulmão respondem à quimioterapia, mas o crizotinib reduziu os tumores em 60% de 82 pacientes que participaram de um teste clínico.

Linnea Duff, uma das primeiras pacientes com ALK positivo que participaram do ensaio clínico no Hospital Geral de Massachusetts, disse que depois de sete semanas tomando as pílulas de crizotinib ela não conseguia mais ver nenhum dos vinte tumores que marcavam seus pulmões nas tomografias. A olho nu, parecia que meu câncer havia derretido, disse Duff, que tem 51 anos.

A anomalia genética combatida pelo crizotinib é rara. Ela atinge apenas de 3% a 5% dos 200.000 pacientes diagnosticados com câncer de pulmão nos EUA a cada ano. Com um mercado tão pequeno, seria impossível para o crizotinib se tornar o novo Lípitor da Pfizer.

Mas, desta vez, a equipe de negócios da companhia conseguiu ver um jeito de um mercado pequeno fornecer fortes retornos, uma vez que muitos planos de saúde nos EUA cobririam remédios caros se os testes pudessem indicar os pacientes com maior probabilidade de benefícios.

Vários medicamentos específicos para subgrupos de pacientes com câncer conseguiram se tornar campeões de vendas. O Herceptin, da Roche Holding AG, que trata pacientes com câncer de mama e de estômago com um gene hiperativo, custa até US$ 50.400 por uma fase de tratamento e gerou US$ 6,8 bilhões em vendas em 2010.

Houve uma mudança de paradigma, disse Christensen. A nova linha de pensamento é Se você encontrar pacientes em que o medicamento funciona, e se o benefício for suficiente, vamos encontrar uma forma de colocá-lo no mercado.