Fármacos biológicos atingem alvo específico

 (O Globo)

 

 

 Para ter ideia da importância da medicina personalizada, 50% das pessoas no mundo usam fármacos de forma errada, segundo a Organização Mundial de Saúde. Só nos Estados Unidos, esses erros são responsáveis por 4% dos óbitos e de 5% a 7% das internações. No Brasil, o uso inadequado de medicamentos causa 30,7% das intoxicações e 19,7% dos óbitos, de acordo com o Ministério da Saúde. Muitos desses números serão reduzidos com mais pesquisas de farmacogenética e drogas biológicas. Um exemplo é o abacavir, antiviral contra o vírus da Aids, o HIV. Pacientes com um gene chamado HLAB*5701 correm risco de reação alérgica ao remédio.

 

 

— Mais importante que testes genéticos para identificar quem responde ou não a um medicamento é saber interpretar os resultados. Nem todos os médicos estão preparados — diz Guilherme Kurtz.

 

No caso de câncer de mama, houve um grande avanço, lembra o cientista. Nessa doença, em até 25% dos casos o gene da proteína HER2 foi alterado, o que estimula a divisão e a proliferação de células. E só pacientes com a biópsia positiva para HER2 beneficiam-se da droga trastuzumabe.

 

— Ela é um anticorpo monoclonal (produzido a partir de células de defesa, linfócito B), que age especificamente no receptor HER2, o que torna o tratamento do tumor mais eficaz — explica o cientista.

 

Foi o que ocorreu com a professora carioca Margareth Guimarães Martins, de 53 anos. Positiva para HER2, ela se beneficiou da trastuzumabe.

 

— Essa droga é mais confortável do que a quimioterapia convencional. Não tive problemas de efeitos colaterais — conta Margareth, que conseguiu que seu plano de saúde pagasse o remédio, o que é difícil.

 

No tratamento de Margareth, os médicos associaram a trastuzumabe a outras técnicas, inclusive a quimioterapia padrão. Isso reflete o estágio de desenvolvimento das pesquisas nesse campo. São poucos os tumores em que apenas a terapia-alvo resolve o problema, como acontece em alguns casos de câncer de pulmão. Mesmo assim, ela já é uma evolução, pois é possível diminuir a dosagem do tratamento mais agressivo, direcionando cada vez mais o combate ao câncer e protegendo o restante do organismo.

 

Outro grande passo são as vacinas terapêuticas contra tumores malignos. A partir de estudos do nosso sistema de defesa — inclusive com a contribuição do cientista canadense Ralph Steinman, Prêmio Nobel de Medicina de 2011 e vítima de câncer de pâncreas —, foi possível desenvolver as vacinas imunológicas. A equipe de Steinman descobriu as células dendríticas. Elas ativam os linfócitos T, essenciais para a memória imunológica contra intrusos. Essa descoberta levou médicos a testarem as vacinas contra tumores de pâncreas, próstata e melanoma (tumor de pele mais agressivo), entre outros. Elas carregam antígenos que estimulam nossas defesas contra proteínas que, em geral, são parte do material do tumor.

 

O alto custo dessas drogas é o maior entrave a seu acesso, mas os médicos acreditam que o futuro está na medicina personalizada. O preço unitário por frasco do trastuzumabe varia de R$ 8 mil a R$ 10 mil. Nos Estados Unidos, a aplicação da vacina terapêutica contra câncer de próstata avançado, a Provenge, custa cerca de US$ 90 mil. São preços elevados para tratamentos em que os pacientes lutam por sua vida. No Brasil, o Sistema Único de Saúde (SUS) tem uma lista com centenas de medicamentos de alto custo — incluindo drogas personalizadas — que são fornecidas gratuitamente aos pacientes. Mas tudo depende da avaliação de cada caso pela equipe médica. Quem estiver interessado encontra informações no endereço do Ministério da Saúde: http://portalsaude.saude.gov.br.