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Estudos acham centenas de pontos ligados à obesidade no genoma
Dois gigantescos estudos que envolveram 300 mil pessoas abrem as portas a uma n ova abordagem para a obesidade, uma verdadeira epidemia global que afeta mais de 600 milhões de seres humanos segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS). Ao encontrar mais de 140 novos pontos no genoma associados a vários traços característicos da doença — reforçando enormemente as teorias da origem genética para o problema —, cientistas do consórcio Giant (sigla em inglês para “investigação genética de traços antropométricos”) dão o primeiro passo em direção do desenvolvimento de novas drogas e estratégias que afetem a ação das proteínas cuja produção é governada por esses genes. Isso se traduz em tratamentos individualizados da obesidade no lugar das dietas e das recomendações genéricas para o controle da balança.
Frequentemente associada a riscos aumentados de problemas cardiovasculares e esqueléticos e males como diabetes e alguns tipos de câncer, a doença p assou recentemente a ser considerada até um tipo de deficiência no âmbito da União Europeia. Ainda segundo a OMS, os 600 milhões de obesos fazem parte do grupo de 1,9 bilhão de adultos estão acima do peso no planeta, enquanto 42 milhões de crianças com menos de 5 anos também tinham o índice de massa corporal (IMC, parâmetro usado para definir a obesidade) acima do recomendado em 2013.
‘Encontrar genes é só o fim do começo’
Já no Brasil, dados da pesquisa Vigitel 2013 (Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico) revelaram que 50,8% dos brasileiros estão acima do peso e que, destes, 17,5% são obesos.
— Encontrar os genes que aumentam o risco para a obesidade é apenas o fim do começo — diz Ruth Loos, professora de medicina preventiva do Hospital Monte Sinai, nos EUA, e uma das principais autoras dos trabalhos publicados na edição desta semana da revista “Nature”. — Um dos maiores desafios agora é aprender sobre a função dessas variações genéticas e como elas de fato aumentam a suscetibilidade das pessoas a ganhar peso. Este será um próximo passo crítico, que precisará da colaboração de cientistas com uma vasta gama de especialidades antes que nossas descobertas possam ser usadas para a prevenção da obesidade ou o desenvolvimento de estratégias de tratamento.
Num dos estudos da “Nature”, pesquisadores focaram os lugares onde a gordura é armazenada no corpo, um dos fatores determinantes para os riscos que ela traz à saúde. Um dos traço s observáveis associados às variações genéticas foi a proporção entre as circunferências da cintura e do quadril. Pessoas com cinturas maiores que os quadris têm mais gordura acumulada em torno de seus órgãos abdominais, o que eleva os riscos de terem problemas metabólicos, como diabetes do tipo 2, e cardiovasculares, quando comparadas com aquelas cuja gordura se concentra mais nos quadris ou é distribuída mais equilibradamente por todo corpo. Ao todo, os cientistas identificaram 49 genes, dos quais 33 novos, que influenciam nesta proporção entre cintura e quadril. Destes, 20 afetam de forma diferente homens e mulheres, com elas sofrendo influências mais fortes de 19 e eles de apenas um.
— Ao encontrarmos as variações genéticas que têm um papel importante na distribuição da gordura corporal e as maneiras como esta distribuição difere entre homens e mulheres, esperamos poder focar n os processos biológicos fundamentais por trás disso — destaca Cecilia Lindgren, pesquisadora do Instituto Broad, mantido em conjunto pelo MIT e a Universidade de Harvard, nos EUA, professora da Universidade de Oxford, no Reino Unido, e também uma das principais autoras dos estudos.
A outra pesquisa procurou por associações diretas entre a genética e o índice de massa corporal, identificando 97 regiões no genoma relacionadas a altos IMCs, das quais 56 são novas. Segundo os pesquisadores, esse número mostra que a predisposição para a obesidade não pode ser atribuída à ação de um único gene, reforçando a ideia de que eventuais futuros tratamentos com base nas descobertas deverão ser administrados caso a caso.
— O grande número de genes torna menos provável q ue uma única solução para derrotar a obesidade funcione para todos e abre a porta para possíveis caminhos em que podemos usar essas pistas genéticas para ajudar na batalha contra ela — comenta Elizabeth Speliotes, professora da Universidade de Michigan, nos EUA, e autora sênior do segundo estudo.
Mais dados sobre doenças correlatas
Levando mais à frente esses achados, os pesquisadores descobriram que algumas das variações genéticas associadas à tendência para a obesidade provavelmente também estão ligadas a processos cerebrais que controlam o apetite e o uso da energia pelo corpo. Assim, eles esperam que, uma vez que tais mecanismos sejam mais bem compreendidos, possa-se explicar por que nem todas as pessoas obesas desenvolvem doenças metabólicas como diabetes e colesterol alto. Além disso, espera-se que os achados ajudem no desenvolvimento de tratamentos para prevenir a obesidade e o aparecimento dessas doenças em indivíduos que já são obesos.
— Esse conhecimento da ligação genética com a obesidade permitirá, em futuro próximo, que o indivíduo obeso, após uma análise de seu genoma, tenha um tratamento individualizado, livrando-se de regimes que na maior parte das vezes não resolvem o problema. Será a medicina personalizada para a obesidade — aposta Celia Koiffmann, professora do Centro de Estudos do Genoma Humano da USP.
Colaborou Antonella Zugliani
Fonte: Portal O Globo