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Empresas não estão prontas para lidar com erros e fracassos
Por Alicia Clegg | Do Financial Times
Como as empresas lidam com o fracasso? Como deveriam? Os gestores sempre falam em dar autonomia aos funcionários, para que assumam riscos e aprendam com seus erros. Mesmo assim, poucas organizações sabem falar sobre o fracasso quando ele acontece, e um número menor ainda sabe quais lições tirar disso - conforme ilustram muito bem as consequências da crise bancária, os projetos de TI caros demais e a enorme quantidade de lançamentos de produtos mal executados.
Algumas companhias podem não ter capacidade para investigar o que saiu errado, mas outras nem tentam. “Se um lado do negócio está ganhando muito dinheiro e o outro está tendo perdas pequenas que podem ser facilmente absorvidas, a atitude frequentemente é \'por que se preoc upar?\'“, diz Jan Hagen, professor e especialis ta em falhas de gestão da European School of Management and Technology.
Apontar o que não está funcionando pode tornar pessoas impopulares, assim como alertar sobre problemas que se aproximam e que a maioria prefere ignorar. No entanto, entre as organizações que levam o gerenciamento de erros a sério - como as companhias aéreas e as de cuidados com a saúde -, várias evidências comprovam que quando as pessoas falam abertamente sobre os erros, a motivação e o desempenho melhoram.
Amy Edmondson, professora da Harvard Business School, identifica três tipos de falhas: deslizes e equívocos que podem ser evitados, contratempos que surgem de situações complexas e imprevisíveis e falhas exploratórias que merecem encorajamento como parte do processo criativo. Todas elas exigem uma condução diferente, mas frequentemente produzem uma reação inapropriada.
Um exemplo é a 3M. Sob a liderança de James McNerney, a companhia aplico u o Six Sigma - uma técnica criada para eliminar defeitos e custos de produção - em todas as suas operações, incluindo seus laboratórios de pesquisa. Os lucros melhoraram no curto prazo, mas seus cientistas perderam a disposição de se envolver com experimentos criativos, reduzindo as chances de descobertas significativas.
Não é apenas falhando de maneira criativa que os indivíduos e as equipes se aproximam de seus objetivos. Manter uma agenda dos deslizes do dia a dia e discutir o que deu errado e por quê, pode revelar oportunidades para reforçar os processos e melhorar o treinamento, reduzindo a possibilidade de ocorrência de erros.
Mesmo assim, se é esperado que os funcionários falem sobre o que não deu certo, eles precisam saber que vai ser seguro fazer isso. “Não se aprende nada se os caras que falam sobre os seus erros são crucificados“, diz Andreas Hummel, diretor de gerenciamento de qualidade das operações de desenvolvimento de produtos da BMW. Por outro la do, se não há retaliação, o que vai impedir o s funcionários de continuarem negligentes?
Há mais de uma década o setor da aviação enfrenta o dilema de como acabar com o jogo da culpa sem fechar os olhos à negligência. Após experimentar várias formas de prestação de contas isentas de culpa, muitas companhias aéreas agora seguem um sistema chamado “Just Culture“.
Ele coloca o ônus sobre os funcionários que reportam erros que cometeram inadvertidamente - como exceder um limite de velocidade, por exemplo.
A contrapartida é que os funcionários que reportam a si mesmos não serão advertidos, embora possam receber treinamento extra. Mas há algumas ações - como quebrar as regras deliberadamente - para as quais não são feitas concessões. “O objetivo é estimular um ambiente em que fique bem claro que os funcionários que cometem erros honestos ou julgamentos errados [e os informam] não incorrerão em medida punitiva“, afirma Helmut Kunz, diretor de t reinamento corporativo da Airberlin.
A qu estão é aprender com o erro, e não permitir que aqueles que desprezam as regras escapem das consequências. Para algumas organizações, isso envolve mudar a linguagem usada na análise do que deu errado.
Em 1999, Julie Morath, uma especialista em cuidados com a saúde cujo trabalho vem sendo estudado por acadêmicos, entrou para o Children\'s Hospitals and Clinics of Minnesota com um mandato para melhorar a segurança dos pacientes. Ela se deparou com uma cultura da culpa clássica, em que os indivíduos raramente admitiam seus erros por temerem se transformar em uma espécie de bode expiatório. Julie treinou pessoas para investigarem sem apontar o dedo. Hoje CEO do Hospital Quality Institute da Califórnia, ela recomenda fazer perguntas neutras como “o que aconteceu?“, em vez de perguntas julgadoras, como “quem fez isso?“.
Erros graves são sempre o último estágio de uma série de passos menores que se acumulam catastrof icamente, como colocar a pessoa errada no cargo e não supervisioná-la adequadamente. Eles podem parecer inevitáveis, mas em algum momento alguém poderia ter interferido. Eles simplesmente exigem que as pessoas ajam quando percebem que outros, inclusive seus chefes, estão cometendo erros. E aí está um problema. “Quanto mais as pessoas sobem na hierarquia, mais tendem a confiar em seu próprio julgamento e menos os outros tendem a questioná-las“, afirma o professor Hagen.
Não há soluções rápidas, mas as organizações podem encorajar as pessoas a falar a verdade a quem detém o poder. Para começar, Hagen ressalta que os líderes mais graduados precisam deixar de lado a pretensão da infalibilidade e falar sobre “quando eles não acertaram“, em vez de falar apenas sobre os sucessos. Elogiar publicamente os funcionários que soam o alarme passa a mensagem de que a responsabilidade pela prevenção de erros é compartilhada por todos. Na Children\'s Hospitals, Julie impleme ntou o “prêmio surpresa boa“, recom pensando os funcionários que evitavam erros questionando situações.
De modo parecido, consolidar uma cultura de aprendizado exige a liderança certa. Em vez de promover os maiores egos, Hummel aconselha a promoção daqueles que “são abertos ao feedback e abertos em relação às suas falhas“. As organizações também precisam pensar cuidadosamente sobre como vão medir o sucesso. Por exemplo, protótipos e pilotos devem ser criados para alargar fronteiras, e não para funcionar perfeitamente.
A farmacêutica Eli Lilly costumava fazer as chamadas “festas do fracasso“ para homenagear os originadores de tratamentos promissores que não deram certo nos testes. Posteriormente, a companhia percebeu que essa era uma psicologia motivacional fraca. Acostumados a aprender com a experimentação, seus cientistas não gostaram de ver seus melhores esforços serem exibidos como fracassos.
Atualmente, Andrew Dahlem, diretor operac ional dos laboratórios de pesquisa da Eli Li lly, diz que a companhia não comemora mais os fracassos por si. Em vez disso, ela aplaude as pessoas que realizam testes e que contribuem para o conhecimento, seja comprovando uma teoria ou acabando com ela. “Como empregadores em uma indústria em que a maioria das boas ideias não resulta em inovações comerciais, não queremos rotular nossos especialistas como fracassos. Queremos que eles permaneçam otimistas para continuarem a ter novas ideias.“
Data: 13/10/2014
Fonte: Valor Econômico