Droga para diabetes não é indicada contra obesidade, diz Anvisa

 Jornal Pequeno - MA

A Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) emitiu um alerta em que contraindica o uso do remédio Victoza (liraglutida), aprovado no tratamento do diabetes tipo 2, para emagrecimento.

“O uso para outra finalidade que não seja como antidiabético caracteriza elevado risco sanitário para a saúde da população“, disse o diretor-presidente da agência, Dirceu Barbano. Médicos têm relatado o aumento do uso como emagrecedor, afirmando também que a droga está em falta, por causa da procura.
As injeções custam até R$ 500 por mês.

A substância atua no cérebro, reduzindo a fome. Age também no trato digestivo, retardando o esvaziamento do estômago e a movimentação da comida nele (o que aumenta a saciedade). Entre os diabéticos, a perda de peso em pesquisas foi de 7 kg.

A Anvisa diz que, mesmo quando é usado no diabetes, o remédio pode causar efeitos colaterais imprevisíveis.

Os principais relatados até agora são hipoglicemia, dores de cabeça, náusea e diarreia. Também há risco de pancreatite, desidratação, alteração da função renal e distúrbios da tireoide. Outra questão de risco associado a produtos biológicos, como é o Victoza, são reações imunológicas, que podem variar desde alergia até efeitos mais graves.

A Abeso (Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e Síndrome Metabólica) considera “perigoso“ o uso indevido do Victoza. “O remédio não deve ser prescrito para o tratamento de obesidade em não diabéticos até que os estudos específicos sejam encerrados“, diz Rosana Radominski, presidente da Abeso.

Ela diz que está ocorrendo uma corrida de pacientes aos consultórios médicos.
“Isso já ocorreu com o rimonabanto (Acomplia). Temos que ter um pouco mais de bom senso“, diz Radominski. O rimonabanto, que ficou conhecido como “pílula antibarriga“, foi retirado do mercado em 2008 por causar problemas psiquiátricos.
Remédios como o Victoza, análogos do hormônio GLP-1, produzido no intestino delgado, são considerados a principal promessa no tratamento da obesidade.

O endocrinologista Alfredo Halpern afirma que está receitando o remédio para alguns de seus pacientes, com bons resultados.
“Não é a primeira opção de tratamento, mas é uma alternativa para quem não pode usar os outros remédios para emagrecer [anorexígenos], por alguma contraindicação.

Ele não funciona para todo mundo, mas 80% dos pacientes têm alguma resposta.“
Para o endocrinologista Walmir Coutinho, há questões importantes que precisam ser esclarecidas antes da liberação do uso do medicamento para não diabéticos.

“Sabemos que a dose precisa ser maior para eles. Com isso, podem aumentar os efeitos colaterais.“
Coutinho lembra que, se a Anvisa retirar os medicamentos para obesidade do mercado (como a sibutramina), a procura por esse tipo de remédio vai crescer. “Não há milagre. Nenhuma droga serve para todos.“

A prescrição do remédio contra diabetes para perda de peso se encaixa no chamado uso “off label“. Isso é feito quando há evidências de que uma droga aprovada para tratar um tipo de doença pode ser útil para outra, sem trazer riscos desproporcionais para o paciente. Nessas condições, o médico pode receitar sem a indicação da bula, como explica o médico João Baptista Laurito Jr., professor colaborador de ética médica da Unicamp.

O Conselho Federal de Medicina afirma que prescrever um remédio para um fim diferente do descrito na bula não é antiético. “Mas recomenda-se que o profissional estabeleça uma relação clara com o paciente, informando-o das decisões tomadas e de possíveis efeitos adversos associados.“ (DM e JCM)

ESCLARECIMENTO PELA ANVISA

A Anvisa esclarece que o Victoza é um produto “biológico“. Ou seja, trata-se de uma molécula de alta complexidade, de uso injetável, contendo a substância liraglutida. O medicamento, fabricado pelo laboratório Novo Nordisk, foi aprovado pela Anvisa para comercialização no Brasil em março de 2010, com a finalidade de uso específico no tratamento de diabetes tipo 2. Portanto, seu uso não é indicado para emagrecimento.

A indicação de uso do medicamento aprovada pela Anvisa é como “adjuvante da dieta e atividade física para atingir o controle glicêmico em pacientes adultos com diabetes mellitus tipo 2, para administração uma vez ao dia como monoterapia ou como tratamento combinado com um ou mais antidiabéticos orais (metformina, sulfoniluréias ou uma tiazollidinediona), quando o tratamento anterior não proporciona um controle glicêmico adequado“.

Por tratar se de um medicamento “biológico novo“, o Victoza, assim como outros medicamentos dessa categoria, estão submetidos a regras específicas tanto para o registro quanto para o acompanhamento de uso após o registro durante os primeiros cinco anos de comercialização. Além disto, o produto traz a seguinte advertência no texto de bula: “este produto é um medicamento novo e, embora pesquisas tenham indicado eficácia e segurança aceitáveis, mesmo que indicado e utilizado corretamente, podem ocorrer eventos adversos imprevisíveis ou desconhecidos. Nesse caso informe seu médico.“

Para o registro do produto foram apresentados os relatórios de experimentação terapêutica com estudos não clínicos e clínicos Fase I, Fase II e Fase III comprovando a eficácia e segurança do produto, para o uso específico no tratamento de diabetes tipo 2.

É importante destacar que além dos estudos apresentados para o registro, encontra-se em andamento um estudo Fase IV (pós registro) para confirmação da segurança cardiovascular da liraglutida. Os resultados deste estudo podem trazer novas informações a respeito da segurança do produto.

O laboratório fabricante já enviou à Anvisa três relatórios sobre o comportamento do produto, trata-se do documento conhecido como PSUR (Relatório Periódico de Farmacovigilância). Além disto, o Novo Nordisk decidiu incluir, em junho de 2011, em seu Plano de Minimização de Risco (PMR) a alteração da função renal como um potencial efeito adverso do uso da medicação.

Nos estudos clínicos do registro e nos relatórios apresentados à Anvisa foram relatados eventos adversos associados ao Victoza, sendo os mais frequentes: hipoglicemia, dores de cabeça, náusea e diarréia. Além destes eventos destacam-se outros riscos, tais como: pancreatite, desidratação e alteração da função renal e distúrbios da tireóide, como nódulos e casos de urticária.

Para o caso de inclusão de novas indicações terapêuticas deve-se apresentar estudo clínico Fase III comprovando a eficácia e segurança desta nova indicação. A única indicação aprovada atualmente para o medicamento é como agente antidiabético. Não foram apresentados à Anvisa estudos que comprovem qualquer grau de eficácia ou segurança do uso do produto Victoza para redução de peso e tratamento da obesidade.