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Famílias decidem ocultar de doente que ele tem alzheimer
Aos 57 anos, o executivo Walter começou a esquecer. No início, nomes, datas, chaves e compromissos. Por fim, perdeu o rumo de casa.
Hoje, aos 60, não sai sozinho, não dirige e não administra os negócios. A família sabe que Walter tem o mal de Alzheimer. Ele não.
Diferentemente do que acontece nos EUA e na Europa, no Brasil a tendência de médicos e de familiares é poupar o paciente, mesmo se ele ainda é capaz de compreender o problema.
Estudo da Abraz (Associação Brasileira de Alzheimer) com 104 cuidadores revela que 56% deles não contam sobre a doença ao familiar. Mas, ao mesmo tempo, 88% dizem que gostariam de saber se fossem eles o doente.
Entre os argumentos dos familiares para omitir o diagnóstico estão a crença de que a revelação não fará diferença já que ele vai esquecer mesmo e o medo de que a informação cause mais prejuízo do que benefício.
No filme “Para Sempre Alice“, que estreia no Brasil nesta sexta (13), a personagem da atriz Julianne Moore recebe o diagnóstico aos 50 anos - menos de 5% dos casos se manifestam antes dos 65 anos.
Recente revisão de 23 artigos científicos sobre demência, com um total de 9.065 pessoas ouvidas, mostra que 90% delas querem ser informadas sobre o diagnóstico.
O neurologista Rodrigo Rizek Schultz, coordenador do ambulatório de demência da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) e diretor científico da Abraz, defende que a revelação pode favorecer a adesão do paciente ao tratamento.
Outro benefício da revelação é permitir que o doente tome decisões i mportantes antes de per der a autonomia.
“Ele poderá decidir se ficará em casa com cuidador ou numa casa de repouso ou ainda nomear alguém para cuidar das finanças“, diz a psicóloga Fernanda Gouveia, professora da PUC-SP.
Mas, para ela, revelar ou não o diagnóstico de alzheimer depende muito do perfil do paciente. “São poucos os que perguntam. A maioria desconfia, mas tem medo de receber a informação.“
Após ouvir cinco médicos, a família de Walter decidiu não contar a ele sobre a sua condição. “Disseram que seria um estresse desnecessário para ele e que não mudaria em nada a situação, diz o filho Daniel, 31, que prefere não dar o sobrenome.
Segundo Schultz, de uma forma geral, os médicos brasileiros não têm o hábito de revelar o diagnóstico ao paciente. “Se ele pergunta, é nossa obrigação contar. Mas a tendência é deixar nas mãos da família a decisão.“
Para o presidente do Cremesp (Conselho Regional de Medicina), Bráulio Luna Filho, a postura é resultado da cultura latina. “Entre os anglo-saxões, essa questão não existe“, diz. “O médico não pode omitir informação relevante ao paciente. Mas, se perceber que ele não tem estrutura para entender ou aceitar, deve procurar a pessoa mais próxima.“
A questão ganha importância porque a tendência é o alzheimer ser diagnosticado cada vez mais cedo. Em clínicas particulares, 70% dos casos estão em estágios iniciais. Isso possibilita intervenções que permitem uma progressão mais lenta.
Fonte: Folha de S.Paulo